Mamãezinha Querida

Quando minha mãe faleceu eu me senti completamente só. A sua presença desde sempre foi um pouso seguro pois tive o privilégio de ser abandonada por 1 mãe biológica desprovida de afeto e ter a minha guarda transferida p/avó paterna, q me fez 1 pessoa bem mais saudável do q seria nas mãos da outra.

Dona Guillem era uma bela mulher, simples, c/formação sofisticada, humilde, c/porte altivo, falava francês, era pianista, mantinha o corpão mesmo depois de 5 filhos para os quais costurou tudo durante os tempos magros, antes do vovô “ser alguém na vida”.  Ela detestava elogios a minha beleza, dizia q as facilidades desse valor alimentavam a futilidade, q eu devia estudar c/afinco, ser fiel ao meu amor, q pra mandar tem q saber fazer, q macaco olha pro próprio rabo, q quem abaixa demais mostra a calcinha.

Naquela noite de fim de ano, qdo a alimentei no hospital c/sua querida rabanada, ela carequinha para a retirada do aneurisma no dia seguinte, sabíamos q era o fim. Afastadas pela vida, eu sentia por ser diferente do q ela sonhou, mas mesmo nos meus momentos mais desvairados o q me manteve firme foi a ética q essa grande mulher me passou c/1 carinho pouco usual, de uma mãe dedicada, porém, severa; era comedida em abraços e beijinhos, mas me acordava todas as manhas c/1 xícara fumegante de café forte. Oh, coisa boa!

Aos 7/8 anos eu queria ser santa, uma nossa senhora de alguma dessas coisas q tem por aí. Eu me enrolava nuns panos e ficava rezando de véu diante do espelho da pentedeira, circunspecta. Ela e Tia Ninice ficaram preocupadas e me convenceram de q essa história de ser esposa de jesus era roubada, casar c/homem de verdade era bem mais divertido (nunca contei pra elas q não era freira, eu achava q daria a maior confusão). Aí eu virei princesa, usando as mesmas roupas da santa, só q enfeitada com todos os badulaques disponíveis. E no meu dedo o lindo anel de água marinha c/brilhantes q vovô lhe deu ao finalmente ter dinheiro sobrando pra tamanha excentricidade. Elas, como súditas, deviam beijar o símbolo da realeza ao falar comigo.  Vovó mandou titia me dar o anel qdo morresse, e sortear as jóias restantes entre as outras netas.

Hoje aqui estamos, eu e meu anel de princesa, viajando mundo afora, em êxtase pela beleza desse planeta surpreendente, rolando lágrimas de saudades do amor vivido com a melhor mãe do mundo. A morte não mata o nosso amor, nem a emoção de tê-lo usufruído!

E q fique registrado: esse anel é da minha netinha. Se eu morrer antes dela nascer, quero q Walter ensine pra ela, como Vovó Guillem me ensinou e eu transmiti p/ele, q nós somos filhos do sol, herdeiros de Pachamama, a senhora da terra e da fertilidade, viemos aqui p/mostrar q força, energia e coragem não dispensam empatia, bom humor e generosidade!

… nem 1 ocasional frescurinha, né, Walter?